sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Um instrumento de Adaptação ao Aquecimento Global - o Esgoto condominial



As Mudanças Climáticas vão avançando. Caminham na direção de contribuir negativamente ao Homem por meio da expansão dos vetores de doenças. A água é um meio especialmente favorável aos microorganismos patógenos e vai se tornando mais e mais favorável com o aumento das temperaturas médias. E a água usaUm inovativo sistema de coleta de esgoto comoda, o esgoto sanitário, é um meio repleto de elementos patógenos, que ganham condição de aumentar a propagação com o aumento da temperatura. 

Uma forma de adaptação, se contrapondo a este efeito do Aquecimento Global é expandir o esgotamento sanitário para torná-lo universal no atendimento a cada grupamento humano. O fator limitante é o relativamente alto custo dos sistemas convencionais de coleta do esgoto. Leva a que haja um grande déficit no atendimento da coleta, comparativamente ao abastecimento d'agua. O déficit é concentrado nas áreas mais pobres. É concentrado nas áreas que mais intensamente sofrem os efeitos negativos do aquecimento.

Uma grande contribuição para que o atendimento da coleta se torne universal poderia vir de uma tecnologia que apresentasse custos substancialmente mais baixos para a coleta de esgoto sanitário. Pois esta tecnologia já existe. É o sistema condominial de coleta de esgoto sanitário, concebido pelo Engenheiro José Carlos Melo, em esforço para universalizar o esgotamento sanitário em Natal, capital do não rico estado do Rio Grande do Norte, Brasil. Reduz os custos do sistema de coleta a cerca da metade. O sistema condominial está baseado na junção de unidades usuárias de um mesmo quarteirão para um único acesso à rede pública. A unidade de atendimento deixa de ser um consumidor e passa a ser um grupo de consumidores.  É um sistema muito flexível. Dispensa a caríssima rede pública (cara por metro linear, pela sua bitola e pela sua profundidade média) de passar em todas as ruas, formando um elo ao redor de cada quarteirão. O ovo de Colombo para reduzir o custo da coleta consistiu em substituir a malha em torno de todos os quarteirões por uma rede de baixo custo ao redor de cada quarteirão. A rede interna a um quarteirão usa canalização de pequeno diâmetro, 10 a 15 cm (4 a 6 in) e baixa profundidade, de 30 a 90 cm (12 a 36 in). A rede pública, de grande diâmetro e profundidade de até 6m (20 feet) só precisa passar no ponto de cota mais baixa do quarteirão para receber a ligação da rede condominial local do quarteirão. Assim, reduz-se substancialmente o tamanho da rede pública.

A rede de coleta condominial pode correr a canalização no fundo dos lotes. Nesta configuração, gera queixumes contra este sistema de menor custo pela necessidade de acesso ao interior dos lotes para trabalhos de manutenção. Pode passar nos jardins, na frente das casas. Mas, evitando qualquer problema com a parte interna das propriedades privadas, pode correr sob a calçada, que é pública.

Há a queixa de que ocorrem com mais frequência, na rede condominial, as necessidades de intervenção para manutenção, por problemas de entupimento mais frequentes do que com o uso do sistema convencional. Mas, vejamos, não há ao que se saiba, muitas reclamações no sistema de esgotamento de edifícios com, digamos, 6 apartamentos ou 20 deles. Por que haveria de ser problemática a junção de 6 ou 20 casas, unidas por um ramal tal como os apartamentos nos edifícios?

O sistema de esgotamento condominial representa, pelo mais baixo custo, uma contribuição a viabilizar a desejada universalização do atendimento da coleta de esgoto sanitário, reduzindo a exposição das comunidades às doenças veículadas via água. Basta que seja realmente bem construído e bem usado. Seu uso é uma solução para as comunidades de baixa renda. Mas, não é restrito a elas. Também pode substituir a implantação de sistema convencional mesmo em expansões urbanas de alta renda que podem arcar com ele. Para estas, todavia, o sistema condominial só será usado pelos que preferirem ter um menor custo.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

A dimensão da Seca





A Seca é um dos eventos extremos a se tornar mais frequente e mais intenso ao longo do avanço do processo do Aquecimento Global. Daí a importância de que sejam conhecidas, por todos, a extensão e intensidade das dimensões da Seca. Tal conhecimento dá a idéia sobre os custos da não adaptação a este fenômeno, que se espraia em muitas partes do nosso planeta e tende a se tornar mais frequente e mais intenso como desastre natural.

A Seca é bem conhecida pelos habitantes do semiárido brasileiro. Ao longo da História   praticamente não há habitante do semiárido que na sua vida não tenha sido exposto algumas vezes ao fenômeno da seca e a pelo menos a uma das terríveis grandes secas (excluidos, obviamente os que tenham tido morte prematura). E é fortemente presente na literatura nacional brasileira (SCOVILLE,2014). Tudo isto antes que o fenômeno venha a ser intensificado pelo Aquecimento Global.

A primeira notícia sobre seca foi descrita pelo padre Fernão Cardin, referindo-se à seca de 1583-1585 (Isto mesmo, não é erro de digitação, foi há quatro séculos e meio atrás. A princípio o fenômeno passaria despercebido pelos portugueses, pois começaram a ocupação pelo litoral do Nordeste, uma região úmida, hoje chamada Zona da Mata, que se estende até cerca de 5 dezenas de quilômetros (três dezenas de milhas) para o oeste das praias. Só notariam as secas quando na expansão da invasão, se adentraram para oeste da Zona da Mata. Nesta primeira seca notada pelos portugueses chegaram aos territórios por eles conquistados cerca de cinco mil índios, expulsos do semiárido pela brutalidade do fenômeno atmosférico (CEPED. 2015).

Século e meio depois a seca volta a ser objeto de atenção e de uma forma tão pouco racional que evoca uma situação de desespero:



A irracionalidade do pedido vem por conta do destino que teriam os escravos que viessem substituir os que morreram de fome. Na medida em que a causa das mortes, a seca, não tinha sido removida, os novos escravos estariam expostos à mesma condição que tinha causado as mortes. Iriam somente ampliar a lista dos mortos.

A sequência de secas, presente na forma extrema em todos os séculos da história do Nordeste (BARRETO, 2009) gera “uma triste história em que a morte rondou diuturnamente a vida dos sertanejos”(VILLA, 2000, p.13), bastando considerar que nos séculos XIX e XX as vítimas fatais foram em torno de três milhões de pessoas, um número assaz elevado, considerando a baixa densidade populacional do semiárido ao longo deste período. Uma única seca, a de 1877-1879, sem dúvida uma das mais terríveis, teria dizimado cerca de 4% da populaçãonordestina (MARTINEZ, 2002) (Note-se que a população exposta à seca era bem menor do que a população da região litorânea. O percentual de mortos na região interiorana, exposta à seca, foi muitas vezes maior.).

A seca severa que atingiu o Nordeste de 2012 a 2016, afetando uma população de 33,4 milhões de pessoas, só entre 2013 e 2015 causou um prejuízo de R$ 103,5 bilhões (cerca de 30 bilhões de dólares). Foi o levantamento feito pela Confederação Nacional dos Municípios - CNM, com dados do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres.
Note-se que não são computados os custos humanos, como os representados pela subnutrição e seus efeitos e pelos efeitos do consumo de água imprópria.

Todos os desastres naturais do país, também entre 2013 e 2015, causaram prejuízo de R$ 173,5 bilhões. Ou seja, 60% do prejuízo no Brasil com todos os eventos extremos se concentraram pela falta de chuva no Nordeste, numa região onde a água é um fator limitante ao desenvolvimento (SUASSUNA, 2009).

O levantamento aponta que todos os desastres naturais do país, entre 2013 e 2015, causaram prejuízo de R$ 173,5 bilhões. Ou seja, 59,7% do prejuízo no Brasil com todos os eventos extremos se concentraram na falta seca no Nordeste, o qual representa apenas 18,9% da área do país (MADEIRO, 2016).

Os prejuízos computados envolvem grande parte da safra, perda de grande parte do rebanho, especialmente de bovinos, perda de pastagens. Mas há também o uso predatório de plantas da caatinga para alimentação animal e a morte de espécies nativas, adicionais aos custo humanos.

Diferentemente das secas históricas de proporções épicas nos séculos anteriores, nesta  atual não se observou o êxodo em massa da população, nem houve morte de pessoas por fome e sede. Isso se deve em parte às políticas assistenciais como o Bolsa Família. O sistema viário e uso de caminhões para transporte de água viabilizam a distribuição de água para necessidades vitais.



Referências

BARRETO, Pedro Henrique (2009). História - Seca, fenômeno secular na vida dos nordestinos. Desafios do Desenvolvimento. Brasília: 6(48). Disponível em: http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=1214:reportagens-materias&Itemid=39. Acesso em: 02.fev.2017.

CAMPOS, José Nilson B. Secas e políticas públicas no semiárido: ideias, pensadores e períodos. Estudos avançados 28 (82) 2014.

Centro de Estudos e Pesquisas em Engenharia e Defesa Civil - CEPED (2015).
1583/2012: Histórico de Secas no Nordeste do Brasil. Disponível em:

MARTINEZ, Paulo Henrique (2002). Resenha de VILLA, Marco Antonio (2000). Vida e morte no sertão: história das secas no Nordeste nos séculos XIX e XX. São Paulo: Ática. Revista Brasileira de História, 22(43):251-254. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbh/v22n43/10922.pdf. Acesso em: 06.fev.2017.
Fortaleza: Fundação Konrad Adenauer, Série Debates n° 24.

MADEIRO, Carlos (2016). Em 3 anos, seca severa no Nordeste causa prejuízo de R$ 103,5 bilhões. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2016/11/23/em-3-anos-seca-severa-no-nordeste-causa-prejuizo-de-r-1035-bilhoes.htm. Acesso em: 06.fev.2017.

SCOVILLE, André Luiz Martins Lopez de (2011). Literatura das Secas: Ficção e História. Curitiba: UFPR. [Tese de doutorado]. Disponível em: thtp://acervodigitJal.ufpr.br/bitstream/handle/1884/26633/Andre%20Scoville%20-%20Tese%20Literatura%20das%20secas%20-%20versao%20final.pdf?sequence=1. Acesso em: 03.fev.2017


SUASSUNA, João (2002) . Água - Um Fator Limitante para o Desenvolvimento do Nordeste? In: HOFEISTER, Wilhelm. Água e Desenvolvimento Sustentável no Semi-Árido. Fortaleza: Fundação Konrad Adenauer, Série Debates n° 24, p.117-130. Disponível em: http://www.kas.de/wf/doc/kas_11769-544-5-30.pdf. Acesso em: 03.fev.2017

VILLA, Marco Antonio (2000). Vida e morte no sertão: história das secas no Nordeste nos séculos XIX e XX. São Paulo: Ática.

Revisto em 24.04.2017

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Educação populacional como indicador de potencialidade de Adaptação


A Adaptação ao Aquecimento Global cobre políticas e ações antecipadas, em relação a efeitos observados das Mudanças Climáticas, assim como políticas e ações relativas a reações a efeitos observados. Estas muitas vezes tomam a forma de ações reparativas e de auxílio a atingidos por efeitos de condições extremas, cuja frequência é ampliada como parte das Mudanças Climáticas em curso. 

Para as ações de reação a efeitos observados não há considerações de risco relativo às causas. Mas para ações antecipadas há incerteza e risco. Incerteza pela condição de novo de que um evento pode se cercar, de risco quando se pode calcular a probalidade de ocorrência de um evento de determinadas especificações.
A incerteza e o risco relativo a ações antecipadas levam a fazer sentido dar nelas mais peso a políticas e ações de âmbito geral, benéficas para um conjunto de situações que podem ocorrer. Uma das medidas de âmbito geral é a elevação do nível de educação populacional, especialmente a elevação do percentual de pessoas com ciclo médio de educação completo e, note-se como condição importante, por ser necessária, com boa qualidade. Este, o aspecto da educação, tem a peculiaridade de ter na qualidade importância maior do que na quantidade. 

 
A taxa de resposta aos questionários da pesquisa sobre Adaptação Local ao Aquecimento Global nos municípios das grandes regiões Norte e Nordeste do Brasil, ou seja, a fração que os respondentes representa dos municípios de mesma classe de IDH, revelou-se, segundo a análise das respostas, crescente com o nível de IDH municipal.
A Oficina, através do conhecimento de seus participantes, reconheceu o maior nível de IDH como causa de maior taxa de resposta e como melhor posicionamento para a formulação e adoção de medidas de Adaptação ao Aquecimento Global. Uma medida de Adaptação indireta, portanto.
Destaca-se no IDH o item educação na forma de um índice que, com iguais pesos, compõe com este índice, juntamente com os itens saúde e a renda da população. Na formação do índice de educação, pesam igualmente o índice de alfabetização e um índice do número de anos de escolaridade da população, índice este em que o crucial aspecto qualidade passa ao largo, não sendo sequer mencionado. O índice de alfabetização, por seu turno, tem valor como indicador de cidadania, mas perdeu seu sentido como indicador de potencial econômico. O indicador de potencial econômico passa, no atual estágio de desenvolvimento tecnológico, ao percentual de pessoas adultas com ciclo médio completo de boa qualidade.
A educação populacional é tão importante para o entendimento da necessidade de Adaptação e de compreensão das medidas de Adaptação que mesmo não sendo bem apropriada no IDH, faz deste IDH uma variável associada à potencialidade de adoção de medidas de Adaptação ao Aquecimento Global.