A
Seca é um dos eventos extremos a se tornar mais frequente e mais
intenso ao longo do avanço do processo do Aquecimento Global. Daí a
importância de que sejam conhecidas, por todos, a extensão e intensidade das
dimensões da Seca. Tal conhecimento dá a idéia sobre os custos da não adaptação
a este fenômeno, que se espraia em muitas partes do nosso planeta e tende a se tornar mais frequente e mais intenso
como desastre natural.
A
Seca é bem conhecida pelos habitantes do semiárido brasileiro. Ao longo da História praticamente não há habitante do semiárido que na sua vida não tenha sido exposto algumas vezes ao fenômeno da seca e a pelo menos a uma das terríveis grandes secas (excluidos, obviamente os que tenham tido morte prematura). E é
fortemente presente na literatura nacional brasileira (SCOVILLE,2014). Tudo isto antes que o fenômeno venha a ser intensificado pelo Aquecimento Global.
A
primeira notícia sobre seca foi descrita pelo padre Fernão Cardin,
referindo-se à seca de
1583-1585 (Isto mesmo, não é erro de digitação, foi há quatro séculos e meio atrás. A princípio o fenômeno passaria despercebido pelos
portugueses, pois começaram a ocupação pelo litoral do Nordeste,
uma região úmida, hoje chamada Zona da Mata, que se estende até
cerca de 5 dezenas de quilômetros (três dezenas de milhas) para o
oeste das praias. Só notariam as secas quando na expansão da
invasão, se adentraram para oeste da Zona da Mata. Nesta primeira
seca notada pelos portugueses chegaram aos territórios por eles
conquistados cerca de cinco mil índios, expulsos do semiárido pela
brutalidade do fenômeno atmosférico (CEPED. 2015).
Século
e meio depois a seca volta a ser objeto de atenção e de uma forma
tão pouco racional que evoca uma situação de desespero:
“desde o ano de 1723 até o presente (1729) tem sofrido esta Capitania grande esterilidade de seca e ao mesmo tempo pedem a El-Rei que os mande acudir com escravos, pois os daqui têm morrido de fome”
(CAMPOS, 2014, p.68).
A
irracionalidade do pedido vem por conta do destino que teriam os
escravos que viessem substituir os que morreram de fome. Na medida em
que a causa das mortes, a seca, não tinha sido removida, os novos
escravos estariam expostos à mesma condição que tinha causado as
mortes. Iriam somente ampliar a lista dos mortos.
A
sequência de secas, presente na forma extrema em todos os séculos
da história do Nordeste (BARRETO, 2009) gera “uma triste história
em que a morte rondou diuturnamente a vida dos sertanejos”(VILLA,
2000, p.13), bastando considerar que nos séculos XIX e XX as vítimas
fatais foram em torno de três milhões de pessoas, um número assaz
elevado, considerando a baixa densidade populacional do semiárido ao
longo deste período. Uma única seca, a de 1877-1879, sem dúvida
uma das mais terríveis, teria dizimado cerca de 4% da populaçãonordestina (MARTINEZ, 2002) (Note-se que a população exposta à seca era bem menor do que a população da região litorânea. O percentual de mortos na região interiorana, exposta à seca, foi muitas vezes maior.).
A
seca severa que atingiu o Nordeste de 2012 a 2016, afetando uma
população de 33,4 milhões de pessoas, só entre 2013 e 2015 causou
um prejuízo de R$ 103,5 bilhões (cerca de 30 bilhões de dólares).
Foi o levantamento feito pela Confederação Nacional dos Municípios
- CNM, com dados do Sistema Integrado de Informações sobre
Desastres.
Note-se que não
são computados os custos humanos, como os representados pela
subnutrição e seus efeitos e pelos efeitos do consumo de água
imprópria.
Todos
os desastres naturais do país, também entre 2013 e 2015, causaram
prejuízo de R$ 173,5 bilhões. Ou seja, 60% do prejuízo no Brasil
com todos os eventos extremos se concentraram pela falta de chuva no
Nordeste, numa região onde a água é um fator limitante ao
desenvolvimento (SUASSUNA, 2009).
O
levantamento aponta que todos os desastres naturais do país, entre
2013 e 2015, causaram prejuízo de R$ 173,5 bilhões. Ou seja, 59,7%
do prejuízo no Brasil com todos os eventos extremos se concentraram
na falta seca no Nordeste, o qual representa apenas 18,9% da área do
país (MADEIRO, 2016).
Os
prejuízos computados envolvem grande parte da safra, perda de grande parte
do rebanho, especialmente de bovinos, perda de pastagens. Mas há
também o uso predatório de plantas da caatinga para alimentação
animal e a morte de espécies nativas, adicionais aos custo humanos.
Diferentemente
das secas históricas de proporções épicas nos séculos
anteriores, nesta atual não se observou o êxodo em massa da população,
nem houve morte de pessoas por fome e sede. Isso se deve em parte às
políticas assistenciais como o Bolsa Família. O sistema viário e
uso de caminhões para transporte de água viabilizam a distribuição
de água para necessidades vitais.
Referências
BARRETO,
Pedro Henrique (2009).
História
- Seca, fenômeno secular na vida dos nordestinos.
Desafios
do Desenvolvimento. Brasília:
6(48). Disponível em:
http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=1214:reportagens-materias&Itemid=39.
Acesso em: 02.fev.2017.
CAMPOS,
José Nilson B. Secas e políticas públicas no semiárido: ideias,
pensadores e períodos. Estudos avançados 28 (82) 2014.
Centro
de Estudos e Pesquisas em Engenharia e Defesa Civil - CEPED (2015).
1583/2012:
Histórico de Secas no Nordeste do Brasil.
Disponível em:
MARTINEZ,
Paulo Henrique (2002). Resenha de VILLA,
Marco Antonio (2000).
Vida e morte no sertão:
história das secas no Nordeste nos séculos XIX e XX. São Paulo:
Ática. Revista Brasileira de
História, 22(43):251-254.
Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbh/v22n43/10922.pdf.
Acesso em: 06.fev.2017.
Fortaleza:
Fundação Konrad Adenauer, Série Debates n° 24.
MADEIRO, Carlos (2016). Em 3 anos, seca severa no Nordeste causa prejuízo de R$ 103,5 bilhões. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2016/11/23/em-3-anos-seca-severa-no-nordeste-causa-prejuizo-de-r-1035-bilhoes.htm. Acesso em: 06.fev.2017.
SCOVILLE, André Luiz Martins Lopez de (2011). Literatura das Secas: Ficção e História. Curitiba: UFPR. [Tese de doutorado]. Disponível em: thtp://acervodigitJal.ufpr.br/bitstream/handle/1884/26633/Andre%20Scoville%20-%20Tese%20Literatura%20das%20secas%20-%20versao%20final.pdf?sequence=1. Acesso em: 03.fev.2017
SUASSUNA,
João (2002)
. Água
- Um
Fator
Limitante
para o Desenvolvimento
do Nordeste? In: HOFEISTER, Wilhelm. Água e Desenvolvimento
Sustentável no Semi-Árido. Fortaleza: Fundação Konrad
Adenauer, Série Debates n° 24,
p.117-130. Disponível em: http://www.kas.de/wf/doc/kas_11769-544-5-30.pdf. Acesso
em: 03.fev.2017
VILLA,
Marco Antonio (2000). Vida e morte no sertão: história das
secas no Nordeste nos séculos XIX e XX. São Paulo: Ática.
Revisto em 24.04.2017
Revisto em 24.04.2017
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