Centrais nucleares são indispensáveis. Este o título da matéria postada em 06 de janeiro de 2012 neste blog Inovação e Adaptação ao Aquecimento Global.
O título do ponto de vista da Adaptação ao Aquecimento Global, ou na linguagem dos governos, Adaptação às Mudanças Climáticas, expressa um raciocínio correto, adequado ao aumento de incerteza trazida pela passagem a novos climas, e pela constante mudança de novos climas ao longo do processo de adentramento do Aquecimento Global. O uso de todas as fontes de energia possíveis é uma forma de adaptação ao maior nível de incerteza do futuro. Entre estas fontes está a energia nuclear, que não deve, então, ser descartada.
O texto que segue discorda deste ponto de vista. Houve a tentativa de colocá-lo como comentário. Mas extrapolou o tamanho permitido. Para seja dado acesso ao ponto de vista discordante, fica aqui colocado como uma postagem.
Usinas nucleares e a questão ambiental
Por
Heitor Scalambrini Costa
Os atuais padrões de produção e consumo de energia estão apoiados nas
fontes fósseis (petróleo, gás natural e carvão mineral), o que gera
emissões de poluentes locais, gases de efeito estufa e põem em risco o
suprimento a longo prazo do planeta, por serem finitas. É preciso mudar
esses padrões, incentivar a economia de energia e estimular o uso das
energias renováveis (solar, eólica e biomassa). Nesse sentido, o Brasil
apresenta uma condição bastante favorável em relação ao resto do
mundo.
Não existe uma fonte de energia que só tenha vantagens. Não há energia
sem controvérsia, mas a nuclear, pelo poder destruidor que tem qualquer
vazamento de radiação, não deve ser utilizada para produzir
eletricidade, ao menos em nosso país, onde existem tantas outras
opções.
Fica evidenciado que, desde 2005, a indústria nuclear intensificou seu
agressivo lobby em diversos países da região, com forte influência nos
setores legislativos e da política energética, tentando impor a
implantação de usinas, sob o falso argumento de que a energia nuclear é
uma fonte “limpa”, segura e contribui para combater o aquecimento
global.
Com a retomada discutível e equivocada do Programa Nuclear Brasileiro,
reiniciando as obras de construção de Angra 3, e os planos do
Ministério de Minas e Energia de instalar no Nordeste usinas nucleares
– a região do Brasil com maior potencial eólico e solar - nada mais
atual que discutir as razões contrárias a instalação de usinas
nucleares no território nacional .
A opção nuclear para geração de energia elétrica no Brasil e no
Nordeste, em particular, não permite resolver os atuais problemas
energéticos, e contribuirá para com outros problemas sem solução à
vista.
Entre os diversos aspectos relacionados a questão nuclear (risco de
acidentes, social, econômico, segurança energética, militarização,
democracia), a seguir é apresentado sucintamente, questões que cercam a
polemica entre a questão ambiental e o uso da eletricidade nuclear.
Do ponto de vista ambiental é uma meia verdade, afirmações que as
centrais nucleares não contribuem para os gases de efeito estufa, e que
são “limpas”.
Em operação rotineira, as centrais nucleares pouco agridem o meio
ambiente, porém expõem a sociedade ao risco de acidentes que liberam na
biosfera produtos de fissão nuclear de alta radioatividade, que podem
trazer conseqüências catastróficas a vida. Embora pequeno, tal risco
existe, e não pode ser negligenciado. Ademais, essas usinas não
resolveram o problema do que fazer com os rejeitos de alta radioatividade,
cuja deposição final demanda pesados investimentos. Estima-se que estes
rejeitos tenham que ficar isolados durante milhares de anos.
Na geração da eletricidade nuclear a produção de CO 2 é muito
pequena, mas se levarmos em conta o conjunto de etapas do processo
industrial (chamado ciclo do combustível nuclear), que transforma o
mineral urânio, desde quando ele é encontrado nas minas em estado
natural até sua utilização como combustível dentro de uma usina
nuclear é produzido quantidades consideráveis de gases de efeito estufa
. Portanto, além das elevadas emissões de carbono, geram resíduos
tóxicos altamente radioativos e contribui com agressões ambientais.
Além de uma central nuclear consumir elevados volumes de água para sua
refrigeração, tendo sua instalação obrigatoriamente ser próxima a
grandes recursos hídricos (rios, mares, ….).
Portanto, se levarmos em conta todo o ciclo para preparar o combustível
nuclear que será “queimado” nas centrais, pode-se afirmar que esta
fonte energética é uma importante fonte de emissões , que são
produzidas na prospecção do mineral, na extração e no transporte de
urânio, no transporte dos resíduos para processamento ou armazenagem e
no futuro descomissionamento.
Vários estudos científicos têm monstrado que o ciclo do urânio é um
grande consumidor de energia e um forte emissor de CO 2. O estudo
americano “Nuclear Power: The Energy Balance” (2005), que compara as
emissões de CO 2 analisando o ciclo de vida de uma central nuclear e de
uma central a gás natural (com uma potência equivalente) chega à
conclusão que, no longo termo, com o decréscimo da qualidade das
reservas de urânio, a eletricidade nuclear provoca muito mais emissões
que o gás natural consumido na termoelétrica.
O cálculo que faz a Oxford Research Group chega a 113 gramas de CO 2 por
kWh gerado. Isso é aproximadamente o que produz uma central a gás.
Portanto, existe um mito, um afã de descartar, cortar e mostrar de
maneira parcial a realidade desta fonte de energia.
Já de acordo com a metodologia de Storm e Smith para o cálculo de
emissões, o ciclo de geração por fontes nucleares emite de 150 a 400 g
CO 2 /kWh, enquanto o ciclo para geradores eólicos emite de 10 a 50 g CO
2 /kWh.
Segundo dados da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)
considerando a mineração do urânio, o transporte, o enriquecimento, a
posterior desmontagem da usina e o processamento e confinamento dos
rejeitos radioativos, esta opção produz entre 30 e 60 gramas de CO 2 por
kWh gerado.
No caso brasileiro, embora a extração do urânio utilizado pelas usinas
ocorra em território nacional, antes ele vai para o Canadá, onde é
transformado em gás e, em seguida, para a Europa, onde é enriquecido.
Reparem que só nestes deslocamentos, não só existe a emissão de gases
proveniente do transporte e do consumo de energia, mas também um grande
risco da exposição dos materiais radioativos, ao realizarem viagens
intercontinentais.
Verifica-se então grande contradição nos números relacionados às
emissões, e que existe uma polêmica e dúvida sobre a capacidade de
emissão de gases de efeito estufa, ao utilizar o urânio para gerar
eletricidade . Creio que neste caso o aconselhável seja uma ação
preventiva, de não utilização desta fonte de energia.
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Heitor Scalambrini Costa , professor associado da Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE), graduado em Física pela Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP/SP), Mestrado em Ciências e Tecnologias Nucleares na
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e Doutorado em Energética, na
Universidade de Marselha/Comissariado de Energia Atômica (CEA)-França.