A
sigla IPVA significa Imposto sobre
Propriedade de Veículo Automotivo, um imposto anual, estadual, pago
no Brasil, incidente sobre o patrimônio na forma de veículo
automotivo. Mas, no estado de Pernambuco os carros elétricos não
pagam IPVA.
O
título “O carro elétrico desafia o mercado brasileiro” tomou o
maior destaque da página frontal do Jornal do Commercio de Recife,
Brasil, na quinta-feira 15 de fevereiro deste 2018, o dia seguinte à
quarta-feira de cinzas, este o dia de descanso de um pais exausto
pelo carnaval. Para o dizer dos brasileiros mais jocosos essa
quinta-feira foi o verdadeiro primeiro dia útil do ano. Para a maior
parte da humanidade não há como entender o que, por broma, dizem os
brasileiros sobre o dia que segue a quarta-feira de cinzas ser o
primeiro dia efetivo de trabalho no ano. Mas o que é sério é que
a maioria dos sete bilhões de habitantes do planeta Terra não
entende como, já completamente restabelecido do carnaval, se
defenda de forma acrítica, num estado com 9,5 milhões de
habitantes, onde há sólida produção de alcool combustível, que
o incentivo aos veículos movidos a baterias recarregáveis na Europa
caminha a todo o vapor, no Brasil estímulo é tímido e País pode
perder bom momento caso não perceba mudanças no setor (Jornal do
Commercio, 15/02/2018).
Entendem
os sete bilhões que o Brasil, com grande vantagem na produção de
álcool combustível, pela alta produtividade que o sol fornece à
gramínia cana de açúcar, face aos países mais desenvolvidos, tem
a perder e não a ganhar com os carros elétricos. O Brasil que tem
nos carros a álcool que circulam em suas ruas uma excelente solução
para que a circulação de veículos não agrave o Aquecimento Global
está com a sua capacidade de produção de energia hidroelétrica já
em plena utilização, restando pequena margem para ampliação. O
parque de energia elétrica de base eólica que se amplia a cada dia,
mas é insuficiente, sendo complementado pelas caras termoelétricas.
Mas a aposta do carro elétrico, que pela reportagem, devemos apoiar
com afinco, vai deixar de lado a produção de cana de açucar, que
transforma CO2 em álcool, para apoiar um produto que vai
consumir energia elétrica, produzida por meios mais dispendiosos.
Por que devemos apoiar o que irá custar mais caro para nós?
O
tom da matéria publicada é que devemos incentivar com firmeza os
carros elétricos porque são uma realidade inevitável no futuro. Se
não o fizermos vamos perder o bonde da história. Mas qual a
vantagem de jogar os recursos escassos para financiar a compra de
carros elétricos? As empresas que produzem carros aqui no Brasil
adotarão a produção de carros elétricos quando for mais vantajoso
para elas, tenhamos ou não dispendido, no atual momento, escassos
recursos para incentivá-los. A Fiat, a Ford, a General Motors, a
Volkswagen, a Mitsubishi, a Honda, etc, com suas fábricas no Brasil
e em outros países não vão depender, para decidir produzir carros
elétricos aqui, de dinheiro público brasileiro que fará falta a
usos alternativos hoje dramaticamente necessários. Ou seja, o
dinheiro empregado para incentivar o seu uso agora é dinheiro jogado
fora.
Mas
o que se reclama como pouco incentivo é, na realidade, um grande
incentivo que Pernambuco dá à importação de carros elétricos que
desbancam os carros nacionais a álcool, inclusive os produzidos em
Pernambuco. Como a matéria ressalta, os carros elétricos têm o
incentivo da isenção de IPVA, um imposto anual sobre patrimônio no
Brasil, que incide sobre valor dos veículos (valor da fatura para
carros novos; valor indicado pela Fundação Instituto de Pesquisa
Econômica – FIPE, da Universidade de São Paulo – USP para os
usados; o valor indicado pela FIPE serve também para os seguros
automobilisticos; são, em geral, mais elevados do que os praticados
efetivamente no mercado local). É um imposto nada desprezível. É
um imposto estadual e cabe os estados atribuirem as alíquotas que
incidem sobre o valor dos veículos conforme lhes aprouver. No estado
do Ceará, estado litorâneo onde os turistam ouvem contar com sol
todos os dias do ano em suas praias, os cidadãos do estado são
expostos anualmente a pagarem de IPVA de 2,5% a 3,5% do valor de cada
veículo que possuirem, conforme a potência do motor. Já em
Pernambuco, onde se reclama mais dedicação de dinheiro do estado
para incentivar o uso de carros elétricos, paga-se anualmente de
3,5% a 4% sobre o valor dos carros (Tabela 1).
Tabela 1 Taxa de Incidência do IPVA – Imposto anual sobre o
patrimônio incidente sobre o valor de automóveis no Ceará e em Pernambuco - 2018 Brasil |
||
Potência do motor
|
Taxa de Incidência Anual sobre o valor do
automóvel
|
|
Estado do Ceará (1)
|
Estado de Pernambuco (2)
|
|
Até 100 cv |
2,5 %
|
3,5 %
|
Acima de 100, até 180 cv |
3,0 %
|
3,5 %
|
Acima de 180 cv |
3,5 %
|
4,0 %
|
Fonte: (1) Rádio
Verdes Mares, 2018 (Blog)
(2)
SEFAZ-PE, 2016
Em
Pernambuco, onde historicamente não houve habilidade para a obtenção
de uma boa renda do turismo, tenta-se compensar espremendo os
cidadãos locais. E nesta compensação Pernambuco, que renuncia a
receita do IPVA dos carros elétricos, espreme mais os menos
afortunados, que possuem carros com até 100 cv, pois pagam IPVA com
a mesma aliquota de 3% aplicada aos carros com motor de até 180 hp.
Pode parecer desprezível o valor do IPVA, mas para a grande maioria
dos donos de automóveis representa um montante considerável.
Note-se
que seja no Ceará, seja em Pernambuco, um assim chamado profissional
liberal compra um carro um no início de sua carreira profissional,
tome-se como 25 anos o típico desta situação. Aos 65 se aposenta,
tipicamente, de acordo com as regras atuais. São, até este momento,
40 anos, nos quais ele, ao se manter com um carro de até 100 cv terá
pago de IPVA integralmente o valor médio do seu carro ao longo
deste período. Isto no Ceará. Mas se for em Pernambuco, terá, em
identicas condições, pago o valor médio, ao longo destes 40 anos,
o integralmente o valor médio do seu carro, mais 20,0 % deste valor
médio. Os principais fabricantes de carros instalados no Brasil
fabricam modelos com menos e com mais de 100 cv. Os com menos de 100
cv são, em geral, mais baratos. Pernambuco torna a vida mais cara
do que o Ceará para os que usam carros mais baratos. São carros
como o Mobi da Fiat e o Kwid
da Renault, cujos modelos mais simples custam no entorno de R$
30.000,00, justamente o preço das baterias do carro elétrico que
motivou a reportagem. A classe média se sai melhor no Ceará.
A
isenção de IPVA em Pernambuco para carros elétricos, por seu
turno, beneficia os mais abastados. Uma classe econômica muito
superior à classe média. Nada a ver nem com a média alta. Trata-se
de benefício à classe alta, indubitavelmente alta. A matéria
publicada no Jornal do commercio expõe um BMW
elétrico, com 170 cv. É de um fabricante, sem fábrica no Brasil,
apresentando como modelo mais popular, um que tem preço a partir de
R$ 170.000,00. Mas, se o leitor tem espírito esportivo o modelo
correspondente tem preço a partir de R$ 800.000,00. Dá para comprar
uma forta de 13 Mobis e mais 13 Kwids. É coerente com o fato dos
donos de um automóvel elétrico, em Pernambuco, não sentirem
diferença na conta de energia elétrica quando passam a usá-los.
Carros
elétricos já eram produzidos pela brasileira Gurgel. Foram
imaginados para consumir energia elétrica num tempo em que a fartura
de energia elétrica tornou-se tão grande no Brasil que foi criado
um programa para incentivar o seu consumo, o EGTD – Energia
Garantida por Tempo Determinado. A energia no programa EGTD tornou-se
tão barata que empresas industriais chegaram a fazer algo
impensável, qual seja substituir o óleo combustível por energia
elétrica na geração de vapor para fins de transformação
industrial. Mas, nesta época, faltava aos veículos da Gurgel o
apoio de baterias de lítio, sendo prejudicados pelo comparativamente
fraco desempenho das baterias chumbo ácidas, as que continuam
mundialmente consagradas para a operação da parte elétrica de
motores de combustão interna, como os motores usados nos carros a
álcool e a gasolina. Mas agora, nos dias atuais, não há capacidade
de geração de energia elétrica sobrando. Há, sim, faltando. Ou
seja, é hora de ser aconselhável usar o alcool como combustível
nos nossos carros, em vez de pressionar mais o sistema de geração
de energia elétrica. E os carros a álcool são menos contribuintes
ao Aquecimento Global do que os carros elétricos, quando se leva em
consideração a construção das baterias de lítio, conforme visto
na postagem Carros Elétricos: um choque.
O
estado de Pernambuco é sede de uma empresa exemplar na área
automobilistica. Começou com uma das muitas fábricas que há nos
países menos desenvolvidos de baterias que utilizam baterias velhas
e usam o seu chumbo para fazer novas. Décadas após fundadas,
continuam tão precárias quanto quando foram criadas, alimentando um
mercado de veículos envelhecidos, igualmente precários. Mas essa de
Pernambuco recebeu uma orientação correta do ponto de vista
empresarial. Foi uma feliz união de estratégia tecnológica,
determinação de seus proprietários, resiliência para absorver os
choques econômicos, capacidade gerencial, etc. E transformou-se na
maior fábrica de baterias automotivas ao sul do Rio Grande (separa
os EUA da América Latina). Seu progresso tecnológico culminou com o
recente estabelecimento de um instituto de pesquisa tecnológica
próprio, o ITEMM, Instituto Tecnológico Edson de Moura Mororó, que
dá melhor organicidade às atividades de pesquisa e aquisição de
tecnologia que acompanharam a evolução da empresa. A competência
maior do instituto é na área de baterias chumbo-ácidas, onde o
instituto e a empresa produtora concentram suas expertises, já que
abastece o mercado automobilistico existente atualmente. A empresa
está atenta às tendências dos países desenvolvidos e, através do
seu ITEMM, vai ganhando conhecimento na área de produção de
baterias de lítio. É na construção da capacidade de produzir,
competitivamente, baterias de lítio que reside, para Pernambuco, o
não perder o bonde da história no que se refere a carros elétricos.
Se tem que incentivar atividades relacionadas a carros elétricos,
que respondam ao incentivo com emprego e impostos pagos em Pernambuco
é no ganho de conhecimento tecnológico para a produção de
baterias de lítio que encontra racionalidade para uma ação pública
de incentivo e não na aquisição de carros elétricos importados. A
tendência a que uma significativa fração da frota mundial de
automóveis venha a ser constituída de carros elétricos é tão
altamente provável que os chineses quietamente já compraram quase
todas as minas de litio conhecidas e dominam seu mercado. Por isto,
estejamos preparados para esta situação que chegará ou não, mas
se chegar ou não, será, com certeza, à revelia de nossas ações.
E se o Brasil vai produzir carros elétricos ou não, isto não será
alterado por renúncia fiscal para financiar a compra de carros
elétricos importados.
É
apontado pelos chineses, ao comprarem as minas de lítio, que o carro
elétrico vem mesmo. E, mesmo sendo mais racional o uso do carro a
ácool entre nós haverá que prefira o carro elétrico. Afinal,
fomos treinados para termos a Europa Ocidental como a nossa matriz
mental, e tudo que for aprovado lá, deve ser aprovado cá e o que
for reprovado lá, deve ser reprovado cá. Mas os tempos vão mudando
e vai diminuindo o efeito do treinamento. A maioria já descobriu no
Brasil que maio não é nosso mês das flores, como era tomado como
verdade até meados do século XX. E que a Embrapa viabilizou ser a
produção de soja e derivados no Brasil da mesma ordem de grandeza
de todo o produto agrícola da França, o maior da Europa. O tempo
vai levando a que o que é bom para o Brasil seja considerado segundo
a ótica brasileira.
Sabemos ser em vão.
Mas a mudança do esmaecimento do treino colonial nos amima a gritar:
se Pernambuco está tão bem que abre mão do IPVA para carros de
luxo elétricos, quero meu IPVA de volta. O motor de meu carro
funciona com álcool, contribui menos ao Aquecimento Global do que os
carros elétricos, com suas baterias de lítio cuja construção é
profundamente agressiva ao meio ambiente e gravosamente contribuinte
ao Aquecimento Global. O álcool é nosso, gera emprego, renda e
impostos aqui. Não devemos desincentivá-lo. Quero meu IPVA de
volta!
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