sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Convivência com a Seca/Adaptação ao Aquecimento Global: realidade e pesquisa


O campo da agropecuária face ao Aquecimento Global se pronuncia por mudanças climáticas constituídas, principalmente, segundo previsões dos órgãos brasileiros capacitados para tal, onde se destaca o INPE, não só por aumentos de temperaturas, como também, por mudanças nas frequências temporais e de distribuições geográficas das precipitações. No Nordeste, o mais populoso semiárido em termos mundiais, as mudanças intensificam um quadro de má distribuição das precipitações médias que mantém esta região semiárida, onde cada gleba tem sempre a enfrentar um significativo risco de insuficiente chuva. No oeste, na Amazônia brasileira, o leste deve ver nele se instalando um clima hoje predominante no Nordeste, todavia ainda mais quente. É claro que, nestas circunstâncias, de intensificação da seca, intensificar as ações de convivência com a seca representa uma forma de Adaptação ao Aquecimento Global, reduzindo o efeito negativo do maior empecilho a um desenvolvimento sustentável para a região semiárida.

A análise das Home Pages das instituições que fazem pesquisa agropecuária no Norte/Nordeste brasileiros permite concluir que há sistemático trabalho de ampliação do conhecimento capaz de conduzir a uma convivência racional com os padrões climáticos do semiárido. Todavia, este trabalho sistemático é realizado por um, dadas as intensas e extensas necessidades dessas duas regiões, pequeno número de centros de pesquisa. É trabalho que vem se desenvolvendo desde algumas décadas, e resulta num acervo de conhecimento que apoia, principalmente, a produção irrigada. Não deixa inteiramente a descoberto a produção de sequeiro do semiárido do Nordeste, a qual é exposta aos rigores e incertezas do clima. Essa produção de sequeiro se dá numa área semiárida, muitas vezes maior do que as escassas águas permitem irrigar, com  população também várias vezes maior.

São quatro centros da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa, o Instituto Agronômico de Pernambuco - IPA e, em menor escala, as universidades rurais das regiões, bem como as que detêm centros agrários, somados ao recém-criado instituto de pesquisa especificamente voltado para o semiárido, o Instituto Nacional do Semiárido - NSA, que realizam pesquisas para a agropecuária no semiárido. Mas a sociedade não tem feito o conhecimento já desenvolvido ser expeditamente aplicado no mundo real. Embora venha de décadas o desenvolvimento deste conhecimento, de forma codificada, vem de longe o desprezo por ele.

Um exemplo disto está nos ensinamentos de José Guimarães Duque, sobre a estratégia de centrar a exploração econômica das terras agricultáveis da região semiárida aproveitando os pontos fortes dessa grande região semiárida brasileira, que nunca foram devidamente adotados (Como exemplo de sua obras: O Nordeste e as lavouras xerófilas). A exploração das atividades agropastoris continuou, a grosso modo, ignorando as características de alta evaporação e evapotranspiração que a alta radiação solar, combinada com os ventos alísios, conferem às superfícies de água e à vegetação da região, oferecendo risco de salinização às atividades de irrigação, onde e quando a água para tal não falta. E oferecendo, quando se tenta imitar a agropecuária de outras regiões, riscos elevados de quebra de safra, bem acima das outras áreas agricultáveis no Brasil, não só por causa das secas, que incidem sobre cada pedaço de terra como uma variável aleatória, reduzindo significativamente a produtividade média, comparada com outras áreas brasileiras, como por causa de situações de insuficiente umidade edáfica, em relação à que seria requerida em determinadas fases do ciclo de crescimento de alguns vegetais, proporcionando as chamadas “secas verdes”, não menos prejudiciais do que as “secas secas”.

Duas conclusões resultam da análise da informação anteriormente exposta. A primeira se refere à relação de intensidade de pesquisa para Adaptação ao Aquecimento Global ser ou não privilegiada, face à extensão da agropecuária para a sua convivência com a seca. A resposta é que a pesquisa voltada à convivência com a seca é claramente uma pequena parcela da pesquisa agropecuária conduzida na região. É insuficiente face à necessidade da intensidade de fluxo de novos conhecimentos capazes de manter a produção agropecuária no semiárido, que vai tendo seu clima sendo mudado para um mais áspero.

Na agricultura já se dispõe de tecnologia para a produção de palma, para alimentação animal, inexplicavelmente excluída da alimentação humana; para a produção de grãos, na forma do sorgo, altamente resistente ao estresse hídrico, também dirigido à alimentação animal e, também, excluída da alimentação humana; para produção de frutas e frutos de xerófilas nativas. Na pecuária, para a produção de proteína animal, quer na forma de leite, quer na de carne, já se dispõe de ruminantes de grande e de pequeno porte adequados às condições do semiárido.

A segunda se refere a que o conhecimento já desenvolvido adequado à convivência com o semiárido sequer é aplicado de forma consistente. Isto se traduz, na prática, em sinalização, da sociedade às entidades de pesquisa, da suficiência do volume de pesquisa de Adaptação ao Aquecimento Global que ora efetuam. Pesquisas em maior volume não se traduziriam, então, em inovçaão. Quando sim, não são difundidas, para o que concorre o baixo nível de educação populacional na região equatorial brasileira. Mas o acordar da sociedade para a necessidade de adequar o sistema produtivo do semiárido às condições do semiárido está sendo rápido. Já há dezenas de associações civis empenhadas em fazer avançar a convivência com a seca e o governo vem começando a incorporar esta bandeira. Financiamento para a convivência com a seca pode se traduzir em financiamento diferenciado, favorável à exploração de sistemas produtivos que exploram espécies nativas e lhes dão processamento agroindustrial e comercialização adequados, fazendo produzir retornos acima das explorações tornadas inadequadas pode ser instalado em poucos anos. Mas o aprofundamento do conhecimento para a exploração das espécies nativas pode representar décadas de pesquisa, tornando insuficiente o conhecimento de convivência com a seca ora existente, ao longo da agudização dos climas. Por outro lado, a própria adição de oferta de conhecimento para a convivência com a seca facilita o movimento das forças produtivas no semiárido nesta direção. Aumentar o presente fluxo de pesquisa para Adaptação ao Aquecimento Global no semiárido em antecipação à demanda é aconselhável. Tanto quanto possível deve ser desenvolvido tal conhecimento, gerando oportunidades de exploração compatíveis com a atual situação dos mercados.

De:
DIAS, Adriano; MEDEIROS, Carolina 
(Consultores:  MELO,  Lúcia; SUASSUNA, João; TÁVORA, Luciana; WANDERLEY, Múcio)

Relatório Parcial da Pesquisa  Adaptação ao Aquecimento Global:
uma visão sobre a pesquisa agropecuária no Norte/Nordeste
Coordenação de Estudos em Ciência e Tecnologia - CECT/Fundação Joaquim Nabuco  www.fundaj.gov.br.    Recife, 2014

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